Em seis meses, 39 pacientes foram diagnosticados com hepatite A, mais da metade de todos os registros de 2024. Diagnóstico precoce e vacinação são essenciais para evitar casos graves da doença, que pode até matar
Por Nathalia Queiroz Via Correio Braziliense
No mês dedicado à conscientização sobre as hepatites virais, o Julho Amarelo, o assunto volta a ocupar espaço no debate público e nas redes sociais, impulsionado por casos como o diagnóstico de hepatite A do influenciador Kaique Cerveny, noivo da cantora e ex-BBB Juliette.
No caso do Distrito Federal, o aumento dos casos em 2024, comparado com 2023, volta a preocupar. No caso da hepatite tipo A, o crescimento foi de 525%, e de 3,35% para hepatite tipo B. Até junho deste ano, 39 pacientes testaram positivo para a hepatite A. Isso é mais da metade de todos os 79 registros no ano anterior (Veja quadro).
As hepatites virais são doenças inflamatórias que afetam o fígado e, quando não diagnosticadas a tempo, podem evoluir para quadros graves, que podem levar à morte. “Às vezes, as pessoas não sabem que têm uma cirrose e só descobrem quando há uma ruptura de uma variz de esôfago, quando desenvolvem ascite (barriga d’água) ou um câncer de fígado”, alerta, a hepatologista Liliana Sampaio Costa Mendes, da Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH).
Para ela, a alta de casos notada em alguns estados e no DF pode ser em decorrência de a população adulta não ser sistematicamente vacinada contra a hepatite A.
O podcaster do Medo e Delírio em Brasília, Cristiano Botafogo, de 45 anos, foi diagnosticado com hepatite A e contou o caso nas redes sociais. Pouco depois, a companheira dele também precisou de internação por conta do mesmo motivo.
Cristiano relata que os primeiros sintomas da doença foram confundidos com uma virose intestinal. “Era como se eu tivesse comido 10 feijoadas, mas sem o benefício de ter comido uma feijoada”, compara. Ele passou 10 dias no hospital. “Fiquei com o olho amarelo, a pele e a urina amareladas”, relata. Saiu do hospital com a orientação de manter a dieta equilibrada e cortar totalmente o consumo de álcool.
O mesmo foi relatado pelo DJ Lucas Toledo, 28, também acometido pela hepatite A. Ele conta que começou a sentir um enjôo intenso, seguido de febre e urina escurecida. “Um dia, acordei completamente amarelo. Olhos, pele, até embaixo da língua. Parecia um ‘Simpsons'”, lembra. A primeira suspeita médica foi de problema na vesícula, mas após uma série de exames e uma semana de internação, veio a confirmação: hepatite A.
“Perdi sete quilos em uma semana. Saí do hospital muito fraco e debilitado. Não fazia ideia de que a doença fosse tão agressiva.” A recuperação exigiu mudanças drásticas. Lucas teve de pausar a agenda de apresentações e seguir uma rotina de descanso e alimentação regrada.
A hepatite B, considerada uma infecção crônica e silenciosa, é transmitida, principalmente, por contato sexual desprotegido ou com sangue contaminado, e pode permanecer anos no organismo sem apresentar sintomas. A hepatite C também costuma se manifestar de forma discreta e pode ser transmitida por instrumentos mal esterilizados, como alicates de unha, agulhas, materiais de tatuagem e escovas de dente.
Aos 67 anos, o servidor público aposentado Oscar Macedo de Abreu do Nascimento Campos descobriu de forma inesperada que era portador de hepatite C, durante exames preparatórios para uma cirurgia de desvio de septo nasal. Sem apresentar sintomas muito claros, ele foi surpreendido pelas alterações nas enzimas hepáticas e, após a investigação médica, recebeu o diagnóstico. “Não tinha qualquer sintoma específico que indicasse problemas no fígado”, relata.
A suspeita é de que ele tenha sido infectado em 1975, durante uma cirurgia cardíaca, quando ainda era comum o uso de sangue não testado e adquirido por doação paga. “Parei de beber, parei de fumar. Foi uma mudança drástica de vida”, conta. Ele lembra que o tratamento foi longo, agressivo e marcado por batalhas fora do consultório.
Devido ao caráter silencioso das hepatites virais, especialmente os tipos B e C, a ampliação do acesso ao diagnóstico precoce se torna ainda mais essencial. Procurada, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal informou que durante o Julho Amarelo, o governo intensificou a vacinação contra as hepatites A e B nas salas de vacina da rede pública.
Desde maio, a imunização contra a hepatite A passou a ser oferecida gratuitamente para pessoas que utilizam a PrEP (profilaxia pré-exposição ao HIV). A vacina contra a hepatite B segue disponível para toda a população, conforme o calendário do SUS.
Apesar dos avanços, a cobertura vacinal entre crianças ainda está abaixo do ideal, segundo a pasta. A imunização contra a hepatite A atingiu 88,4% entre os pequenos de 12 meses, enquanto a cobertura da hepatite B chegou a 89,3% em menores de um ano, ambos abaixo da meta estabelecida. Em contrapartida, a aplicação da primeira dose nas primeiras 24 horas de vida superou a meta de 95%.
A testagem rápida para hepatites B e C está disponível gratuitamente nas UBS do DF. Também é possível realizar o teste no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), na 508/509 Sul, e na Unidade de Testagem, Aconselhamento e Imunização (UTAI) da Rodoviária do Plano Piloto. O procedimento é simples: feito com uma amostra de sangue da ponta do dedo. O resultado sai em cerca de 30 minutos.
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