Ex-Bozo culpa Xuxa pelo fracasso na televisão: checamos e a verdade é outra…
TV e Famosos
Publicado em 2 de junho de 2022
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Ator que deu vida a palhaço franqueado dos Estados Unidos disse que não podia competir com a Rainha dos Baixinhos e a acusa de abandonar as crianças. Mas o relato é impreciso e contraditório…
Por: Morillo Carvalho, editor Clube.FM
Num depoimento cheio de contradições temporais e preconceitos, Wanderley Tribeck – o Wandeko Pipoca, primeiro Bozo brasileiro – falou ao podcast Inteligência LTDA sobre suas conquistas e fracassos na televisão. No bate-papo ele culpou Xuxa por ter saído da TV – o que veremos adiante que não tem lógica conforme a data – e detonou Sílvio Santos, acusando-o de encher o programa com mulheres “de shortinho”, ao que ele havia “avisado” que não daria certo – o que também parece ser uma informação imprecisa.
Aos 71 anos, Wanderley é pastor evangélico da Assembleia de Deus, e é bem provável que sua fala esteja afetada pelos valores que conserva hoje (e que nada tem a ver com os que carregava à época do Bozo) e que esteja com a memória imprecisa em relação aos fatos.
Xuxa não desbancou Bozo
Antes de formar sua rede de televisão – o SBT -, Sílvio Santos tinha um canal no Rio de Janeiro, a TVS. O SBT nasceu em agosto de 1981, enquanto a TVS já existia desde 1976. Foi ainda no tempo de TVS que o dono do Baú resolveu comprar a marca Bozo, que já existia nos Estados Unidos, e criar a versão nacional do palhaço na televisão. O dono do personagem, Alan Livingston, já o fazia desde 1946, e aprovou Wanderley para ser o Bozo brasileiro.
Só que isso ocorreu em 1980.
Xuxa, enquanto apresentadora infantil, só surgiria na TV Manchete em 1983, para comandar o Clube da Criança, que duraria até o final de 1985. E em 1986, seria contratada pela TV Globo, onde, aí sim, se tornaria a Rainha dos Baixinhos.
Wandeko parou de fazer o Bozo em 1982 – o personagem continuou a existir com diversos outros intérpretes. Ou seja, qualquer acusação de que ele teria saído do ar por causa de Xuxa é, no mínimo, imprecisa – mas nota-se que a proposta dele, no podcast, era apenas atacar a apresentadora, quando a acusa de “ter abandonado as crianças”. Xuxa está com 59 anos e produziu conteúdos para o público infantil até 2016, com o disco “ABC do Xuxa Só Para Baixinhos”. Foi o trigésimo sexto álbum da loira, que tem toda a discografia voltada para o público infantil.
Sexualização infantil e mais contradição
Numa fala carregada de julgamentos morais, se referiu a meninas de 10 a 16 anos que usavam um uniforme sem qualquer conotação sexual – as Paquitas, que eram as assistentes de palco de Xuxa, usavam uma farda estilo “soldadinho de chumbo”, personagem presente no imaginário infantil ainda hoje e, mais ainda, à época – Wanderley, que jamais concorreu com Xuxa no ar, atribuiu seu fracasso ao uniforme das meninas e às atrações que iam ao seu programa.
“O Silvio começou a colocar mulher de shortinho no programa. Falei para ele que não daria certo. Eu saí do ar por causa da Xuxa. Como é que eu vou concorrer com a Xuxa e com as paquitas? Bumbunzinho tudo lá, quem ia querer ver o Bozo?”,
disse Wanderley.
Bom, este era o uniforme e estas eram as Paquitas, então olhar com conotação sexual para elas pode dizer mais sobre quem observa do que sobre quem usa as roupas referidas:
na imagem: as paquitas Roberta Cipriani, Priscila Couto, Ana Paula Almeida e Tatiana Maranhão – que tinham entre 10 e 13 anos – além de Xuxa, Dengue e Praga. Elenco do programa Xou da Xuxa em 1988 – pelo menos seis anos após Arlindo sair do ar
Outra contradição dessa fala está num fato relatado no filme “Bingo”, que conta a história do Bozo. Um dos trechos do filme mostra que o palhaço trabalhava, justamente, na perspectiva contrária: ele incentivava a presença de artistas como Gretchen em seu programa, com a finalidade de levantar a audiência.
Mentira sobre o fim do Bozo
Se por acaso Wandeko estivesse no ar quando foi exibido o último episódio de Bozo – o que se deu quase 10 anos após ele próprio deixar de interpretar o personagem – a justificativa não constava na audiência, como alega agora, ao falar sobre “bumbunzinho tudo lá”, e sim em como quase tudo se resolve dentro do SBT: a decisão de encerrar o programa foi de Sílvio Santos.
À época, o intérprete do Bozo era Décio Roberto e não Wanderley, e o motivo para o encerramento foi porque o dono do SBT não quis pagar o aumento no valor dos direitos de licenciamento do personagem para empresa de Larry Harmon. Nada a ver com audiência. Até porque, durante sua existência, o programa ocupou as mais diversas faixas de horário e não necessariamente concorria com Xuxa – que, curiosamente, teve seu programa Xou da Xuxa encerrado na Globo no final do ano seguinte.
Ou seja, Bozo durou 11 anos, e apenas em cinco deles havia a presença diária da loira na televisão como possível concorrente, e, lembrando, em nenhum deles com Wanderley como intérprete do palhaço.
Conclusões
Wandeko saiu do ar em 1982, um ano antes de Xuxa entrar no ar em sua primeira produção na TV Manchete, o Clube da Criança, que ia ao ar no final da tarde, enquanto Bozo era apresentado nas manhãs da TVS.
Com fama de malandro e de que não decorava falas e soltava palavrões fora do ar, saiu da atração e partiu para a TV Gazeta, onde apresentou A Turma da Pipoca – sendo a Gazeta um canal paulista – até 1985, antes de Xuxa migrar para a Globo e se tornar Rainha dos Baixinhos.
Deprimido com as oscilações na carreira, que ocorriam por seu temperamento, se tornou usuário de drogas, até mesmo esteve em situação de rua e em 2000, 18 anos após deixar de vestir o Bozo para se apresentar, se converteu evangélico e tornou-se pastor.
Quando diz que Xuxa “entrou no lado sexual e ela tá pagando um preço muito alto por isso. Por enganar as crianças. Porque se você é ídolo de crianças, você tem que trabalhar com crianças a vida toda. Eles vieram com ‘Rainha dos Baixinhos’ e agora abandonaram as crianças. Eu não abandonei as crianças, eu saí porque não podia concorrer com ela”, definitivamente atribui o próprio fracasso a alguém que fez e ainda faz muito sucesso – sem qualquer lógica ou nexo com os fatos. Afinal, ela segue sendo querida, amada e seu legado estará em exposição em breve, em São Paulo:
É, portanto, puro ataque gratuito a Xuxa e necessidade de ganhar alguma relevância na internet ao criar polêmicas vazias. Enquanto isso, Xuxa é alguém que, ainda hoje, tem suas músicas executadas nas festas infantis (portanto, ela ainda continua “trabalhando com crianças”, como ele cobra) e que chegou a todo o continente americano e à Europa com carisma, talento e trabalho.
