

Em entrevista ao Correio, o ator Leandro Hassum fala sobre a interpretação que faz em ‘Silvio Santos vem aí’
Por Ricardo Daehn – Correio Braziliense
Inimitável: foi nesta condição do personagem da vida real que o ator Leandro Hassum, aos 52 anos, abraçou o desafio, no set de filmagem, de protagonizar o homem do baú, no longa Silvio Santos vem aí, atração, a partir da próxima quinta, nos cinemas nacionais.
No enredo, há quem aponte o dono do SBT (morto em agosto de 2024, aos 93 anos) como autor de programas “bregas e sem sentido”, mas não é nesta eleição entre representante de qualidade ou de engodo que o protagonista desfila no filme. “Vejo que, enquanto comunicador, não tem ninguém igual a ele”, defende Leandro Hassum. Fases distintas da vida do empresário se avolumam no enredo.
O perseverante multimilionário entra em campo, no filme, numa ocasião muito peculiar, como pré-candidato à eleição presidencial de 1989, a primeira já sob escudo da Constituição de 1988. É na lida com os bastidores de uma campanha incerta, crivada de “ataques” pessoais, que o personagem de Hassum resplandece, inabalável, com o costumeiro carisma.
“Mas, não é, nem de longe, um filme político. É um filme sobre a história de um comunicador”, ressalta Hassum, desafiado, para além da veia de humorista. Interagindo com crianças e homens fantasiados de bichinhos no palco, Silvio quase não toma conhecimento de adversários. A popularidade lhe traz a tranquilidade numa conjuntura de sequer ver o seu nome estampado nas cédulas eleitorais. Com apoio incondicional da esposa Íris (Regiane Alves), Silvio sinaliza desinteresse em comparecer a debates e mesmo encorpar campanha política. “É um cara do qual se pode fazer 10, 15 filmes; são tantas as histórias, tantos momentos”, defende o ator.
Qual a tua expectativa com o filme em ano pré-eleitoral?
É bem importante dizer que esse filme, apesar de a gente tratar do recorte das eleições, não é um filme que fale sobre política. A gente aproveita o recorte de 1989, quando Silvio foi candidato à presidência, para contar a história dele. Achei muito inteligente da parte do Paulo Cursino (roteirista) pegar esse recorte no qual uma jornalista precisa vasculhar a vida do Silvio.
Como assim?
Porque, como candidato, os oponentes iriam vasculhar a vida dele; então, que o pessoal da propaganda dele, que a equipe dele, seja a primeira a vasculhar e saber das coisas. Mas não é, nem de longe, um filme político. É um filme sobre a história de um comunicador. Mas, obviamente, que fazer O candidato honesto, que retratava uma figura pública, que incluía maracutaias e tudo mais — tudo isso ajudou, no filme, obviamente.
Como espectador, como assistiu ao outro filme lançado sobre o episódio do sequestro (Silvio, com Rodrigo Faro)?
Acho que você pode fazer vários recortes da vida do Silvio Santos. É um cara do qual se pode fazer 10, 15 filmes; são tantas as histórias, tantos momentos. Não vou falar mal do filme, eu acho que cada um tem uma leitura, cada trabalho é um trabalho, e respeito muito. Acho que poderia ter tido um corte da história dele melhor do que esse corte da história do sequestro; mas não vou criticar, falar mal, porque a gente nunca sabe como é feito um filme. As escolhas que as pessoas fazem, eu tenho certeza de que fizeram com muito carinho. Se houve críticas, não cabe a mim julgar.
Houve encontro com a família do Silvio, o que viu e ou espera, junto aos comparativos com a figura dele? O que priorizou na elaboração do personagem?
Não, a gente não teve nenhum encontro. O roteiro foi criado pelo Paulo Cursino, a partir de pesquisas dele. E eu, por acaso, infelizmente, nunca tive a possibilidade de conhecê-lo pessoalmente. Construí o Silvio Santos, aliás construindo, ele, na verdade, o Senor Abravanel pesou para mim como grande desafio. Porque o Silvio Santos é uma pessoa que todo mundo acha que imita. Ninguém imita, pois ele é inimitável. O Silvio Santos tem imitadores, o clown do Silvio Santos. Mas o que era o Abravanel em casa, esse pai, esse marido, esse empresário, dono do SBT, esse cara que começa como camelô lá atrás?… Cerquei isso.
O que ele irradiou naquele período complexo de vida, em 1989?
Acho que o mais importante a dizer é que ele não mudou a sua essência. Ele continuou, até ao ser candidato a presidente, sendo um vendedor. Seja vendedor de sonhos, vendedor de carteirinha de título de eleitor, mas um vendedor de sonhos, vendedor de um ideal, e esse comunicador que se colocava no mesmo nível da plateia. Um comunicador que trazia uma identificação muito grande: o público se sentia amigo dele. Foi isso que eu busquei.
Algo em comum contigo?
Busco este tipo de ligação nas minhas comédias, com o meu público, nos meus shows, nos meus filmes. E, com o Silvio Santos, eu só apaguei a minha persona, que era a persona do Leandro Hassum, por ser uma pessoa muito forte na comédia, e deixei que o Silvio ficasse na frente, em primeiro plano. Não é fácil, obviamente, por ter tanto tempo fazendo comédia. Ao mesmo tempo, é muito sedutor, como ator, como artista, poder brincar nos campos do senhor, poder sair e falar diferente e estudar um cara e criar onde eu não tinha o recurso de fugir para as minhas cartas na manga.
Que legado ele implantou?
Tem pessoas que a gente acha que não vão morrer. E há uma coisa interessante: não consigo falar do Silvio no tempo (verbal) passado. Porque eu acho ele realmente imortal. Eu acho que o que o Silvio construiu, enquanto comunicador, não tem ninguém igual. Não tem ninguém igual. Acho que quem quiser estudar como ser um comunicador, como ser um apresentador de programa, como ser um empresário de sucesso, como ser um camelô de talento, terá que estudar o Silvio Santos.
O que você acha que as pessoas esperam de você e o que você espera? Saiu o peso de críticas à comédia no Brasil?
Você me desculpa, a frase que eu vou dizer agora, com relação à crítica a mim: eu tô pouco me f…, sinceramente. É, porque assim, são 64 longas metragens, graças a Deus, de muito sucesso, são 37 anos de carreira. Eu não faço filme para crítico, eu faço filme para público, e o público segue comigo a vida toda, obviamente, um ou outro vai reclamar, a gente não é unanimidade, nem Jesus Cristo foi. Com relação ao Silvio, o que eu tenho para te dizer é o seguinte: ele jamais abandonou a essência dele, ele jamais se vendeu por um movimento. O Silvio Santos foi autêntico até o final. Então, eu acho que nesse lugar a gente se encontra, a gente se encontra muito, nas devidas proporções, eu jamais querendo me comparar a ele, mas a gente se encontra num lugar em que fala assim: “Eu sei o que o público gosta”. Tem uma frase que é muito americanoide, mas que a gente vai falar aqui: Know your audience (conheça a sua plateia). O Silvio, como ninguém, conhecia sua audiência, assim como eu tenho certeza que eu conheço a minha audiência. Então, eu faço filme para o povo, para o público. Eu não faço filme para meia dúzia de amigos assistirem no Baixo Gávea, tomando seus uísques. Eu não faço filme para a galera que fica tomando uísque, os filósofos de plantão; não, faço filme para o povão. É assim com o filme Silvio Santos.
Tratando de valores: Silvio conta da relação dele com dinheiro, no filme; fala que a sorte cobra um preço alto. Para o ícone do humor que fez Até que a sorte nos separe, como você, administra o dinheiro e que preço a fama te impõe? Fazer rir te enriqueceu, em que instância?
Eu acho que a relação do Silvio com o dinheiro é uma relação muito autêntica, assim como ele sempre foi. É uma relação como ele mesmo fala no filme: ‘o dinheiro trabalha para mim’. Eu acho que dinheiro é bom, mas viver é muito melhor. Eu acho que é bom a gente ter dinheiro pra gente poder viver a nossa vida do lado das pessoas que a gente ama. Eu acho que isso, sim, é riqueza, o amor das pessoas ao nosso redor.
Quer dizer, “o povo adora ele e ele adora o povo”, é mais ou menos isso que dizem no filme?
Exatamente. Me identifico, então. É isso, sempre.

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