O programa Meninas em Ação, da Secretaria de Relações Internacionais, escolheu 30 meninas de instituições públicas do DF para acompanhar um dia de trabalho com mulheres em posição de destaque. Iniciativa promove empoderamento feminino e equidade de gênero nas profissões
Por Júlia Giusti* via Correio Braziliense
O projeto Meninas em ação, da Secretaria de Relações Internacionais e inspirado pelo movimento Girls take over, da organização Plan International, foi lançado este ano com o intuito de empoderar jovens meninas e mostrar a elas que é possível alcançar posições de destaque na sociedade e no mercado de trabalho.
Para o secretário de Relações Internacionais do DF, Paco Britto, é desde cedo que se aprende que ocupar cargos de poder é para todos, inclusive, para as mulheres, que enfrentam desigualdade de gênero no mercado de trabalho.
“É relevante despertar o sentimento de pertencimento a esses cargos nas estudantes, para que se sintam representadas e vejam que é possível alcançá-los”, afirma.
Nesta primeira edição, foram selecionadas 30 estudantes de três escolas públicas do Distrito Federal: Centro de Ensino Médio Integrado (Cemi) do Gama, Centro de Ensino Médio (Cem) 01 de Planaltina e Centro de Ensino Médio Setor Oeste (Cemso).
As jovens recebem a tarefa de assumir por um dia, ao lado de importantes personalidades femininas, cargos de liderança em embaixadas, instituições do governo e empresas. Entre os nomes de líderes, estão a primeira-dama do DF, Mayara Noronha Rocha, a vice-governadora do DF, Celina Leão, e a diretora de Redação do Correio, Ana Dubeux.
Em abril, a iniciativa, que tem apoio das secretarias da Mulher, Educação e Justiça e Cidadania, do Governo do Distrito Federal (GDF), foi transformada em programa de Estado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), o que garante a continuidade do projeto nos próximos governos e possibilita o investimento estatal para que ele ocorra. O encontro das estudantes com mulheres protagonistas segue até outubro.
De acordo com o secretário, a seleção das 30 meninas para participar do projeto é feita com ajuda de diretores e professores das escolas participantes, que indicam as alunas que mais se encaixam nos perfis de liderança das autoridades escolhidas. Para as meninas que fossem ocupar o cargo de embaixadoras, por exemplo, a escolha ocorreu entre as que sabiam outro idioma, como inglês, espanhol ou francês.
Além disso, em cada escola, são nomeados professores tutores, para fortalecer a participação das jovens e incentivar o empoderamento feminino por meio da grade horária de disciplinas. Com isso, o objetivo é atingir, também, as meninas não escolhidas para o projeto e os meninos. Para as próximas edições, Britto diz que a Secretaria pretende abrir um edital para o processo e ouvir não só os docentes, mas também os estudantes.
Sarah Alves, 16 anos, foi uma das nove alunas do Cemi Gama selecionadas para participar do Meninas em ação e passou um dia com a comandante-geral da Polícia Militar do DF (PMDF), Ana Paula Habka. A estudante acredita que seu diferencial foi ser uma aluna responsável, comprometida e organizada.
Sarah confessa que não criou muitas expectativas sobre a visita, por achar que as atividades seriam mais voltadas ao lado burocrático da profissão, mas se surpreendeu com a experiência dinâmica e intensa.
“Eu achava que a carreira na PM era fria, cheia de repressão, sem espaço para sentimentos ou para a expressão pessoal. Mas o que vi foi o contrário. Saí de lá apaixonada pela área”, compartilha.
A estudante narra que a visita se iniciou com uma viatura descaracterizada indo buscá-la na escola para o Palácio de Tiradentes, onde se encontraria com a comandante. Durante o dia, a jovem participou de uma sessão de exercícios físicos com o pelotão de choque, conheceu instalações, como o Regimento de Polícia Montada (RPMon) e o Batalhão de Aviação Operacional (BAvOp), tirou dúvidas sobre a profissão, participou de reuniões, discursou com a comandante, andou a cavalo e voou de helicóptero pela primeira vez.
“Nunca tinha andado nem de avião. Ver Brasília lá de cima me fez sentir liberdade e possibilidades”, Sarah se alegra. Para ela, a experiência foi “maravilhosa”, podendo se inspirar em oficiais “competentes e humanas” e crescer como cidadã e profissional. “Isso amplia a visão de mundo, desperta a reflexão e mostra possibilidades que talvez nunca tivéssemos considerado. Queria que todas as meninas tivessem essa oportunidade”, defende.
A comandante da PMDF, Ana Paula Habka, diz que a estudante se mostrou “educada, curiosa, inteligente e interessada em cada detalhe” e tem potencial para liderar e transformar realidades: “Tenho certeza de que essa vivência prática será uma experiência única, que permanecerá em sua memória e contribuirá para as escolhas que ela fará no futuro”
Anna Luiza Cavalcante, 17 anos, aluna do CEM 01 de Planaltina, foi escolhida para passar um dia com a embaixadora da Austrália no Brasil, Sophie Davis, por ter domínio do inglês. Ela recebeu a notícia com muita empolgação: “Gosto de vivenciar coisas novas”
O dia da estudante como embaixadora começou com uma reunião e um tour pelas instalações. Na casa oficial da Embaixada, ela integrou uma mesa redonda sobre a participação de mulheres e meninas no esporte. “Fiquei um pouco nervosa, mas foi incrível fazer o pronunciamento oficial em inglês”, conta. Durante a visita, Anna Luiza também trocou experiências com personalidades importantes, como o presidente da Cricket Brasil, Matthew Featherstone, e Júlia Price, ex-jogadora de cricket australiana.
A jovem percebe a experiência como “única” e, mesmo que poucas meninas participem do apoderamento, “elas podem incentivar outras meninas de sua família, amigas, colegas e vizinhas, levando a mais mulheres no topo”. Anna ainda não sabe qual profissão quer seguir, mas após a visita, diz que as relações internacionais são um caminho.
Para a embaixadora Sophie Davis, o dia com a estudante foi muito produtivo, projetando um futuro promissor para a menina na carreira. “Anna Luiza já demonstra algumas habilidades para desempenhar essa função, incluindo falar com colegas e convidados em inglês em situações formais e informais. Espero que isso lhe dê a confiança de que ela tem a capacidade de realizar qualquer tipo de trabalho”, afirma.
Ana Clara de Andrade, 17 anos, aluna do Cemi Gama, também foi selecionada para participar do projeto. Ela acredita que se destacou pelas boas notas, desenvoltura oral e senso de liderança. A estudante passou um dia com a diretora de Redação do Correio, Ana Dubeux, e acompanhou a rotina da profissional desde as atividades pessoais até o trabalho no jornal.
“Pela manhã, fiz canoagem com ela, e foi um tempo muito revigorante em que aprendi algo novo. Também foi muito interessante participar de reuniões e de outros deveres na Redação e conhecer a estrutura do jornal”, relata. Ana Clara diz que ficou honrada em ser editora por um dia e, apesar de não ter certeza sobre qual profissão seguir, ela percebe que a visita lhe abriu portas: “Conhecer o Correio me fez ter grande vontade de seguir carreira jornalística”
Ana Dubeux diz que foi “muito gratificante” receber a estudante, que define como inteligente, bem informada, determinada e com grande interesse pela comunicação. “O olhar atento e a consciência crítica me fazem crer que ela será uma profissional de primeira linha em qualquer carreira que escolha”, expõe.
De acordo com levantamento da Diversitera, empresa especializada em promover diversidade, equidade e inclusão (DEI) nas organizações, as mulheres ocupam apenas 35% da alta liderança no Brasil e ganham 21% a menos do que homens no mesmo cargo. Em contraposição, elas representam 70% das funções operacionais, como recepção e limpeza. O estudo analisou dados de mais de 90 mil respondentes em 70 empresas de 17 setores entre junho de 2022 e fevereiro de 2025.
Para o secretário Paco Britto, a recepção das estudantes pelas líderes é uma ação simples, mas que tem grande impacto na vida das meninas. Sarah, por exemplo, percebe que uma janela se abriu a ela, “como se alguém te dissesse que você pode”. A jovem aconselha que, mesmo em espaços tradicionalmente masculinos, como a carreira militar, as meninas têm vez: “Você não precisa acertar de primeira, não precisa escolher uma única coisa para a vida toda. Existem possibilidades para nós”
Além de equidade no mercado de trabalho, Ana Clara defende que iniciativas como essa fortalecem a autoestima das mulheres, quebra barreiras históricas e promove ambientes diversos, justos e inovadores. “Mesmo vindo de lugares mais desestruturados, as meninas podem e devem alcançar um lugar de poder na sociedade”, destaca. A embaixadora Sophie Davis lembra que essa também é uma oportunidade para meninos e homens demonstrarem seu apoio à pauta da igualdade de gênero.
* Estagiária sob a supervisão de Ana Sá
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